09 Dec
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Entenda o que diz a lei na prática

Quando uma família tem uma criança autista ou outra pessoa com deficiência em situação de vulnerabilidade, cada fonte de renda faz diferença. E aí surge a dúvida: a criança já recebe pensão por morte, mas também teria direito ao BPC, é possível receber os dois benefícios ao mesmo tempo?

Neste artigo, eu explico de forma simples a regra de não acumulação de benefícios, principalmente entre pensão por morte e BPC, e como isso funciona na prática para famílias atípicas.

O que é o BPC e qual é a regra de não acumulação

O Benefício de Prestação Continuada, conhecido como BPC ou BPC LOAS, é um benefício assistencial que garante um salário mínimo mensal à pessoa idosa com 65 anos ou mais e à pessoa com deficiência de qualquer idade, inclusive autistas, que estejam em situação de vulnerabilidade econômica.

Por ser um benefício assistencial, o BPC não exige contribuição ao INSS, mas exige:

  • deficiência ou idade avançada, conforme a lei
  • baixa renda familiar por pessoa, de acordo com os critérios legais e com o que vem sendo interpretado pela jurisprudência

O ponto central para o nosso tema é que o BPC não pode ser acumulado, pelo mesmo beneficiário, com outro benefício de aposentadoria, pensão por morte ou benefício previdenciário em geral, salvo algumas exceções bem específicas, como pensões indenizatórias e assistência médica.

Em linguagem simples, a regra é:

a mesma pessoa não pode receber BPC e, ao mesmo tempo, pensão por morte, aposentadoria ou outro benefício previdenciário.

O que é a pensão por morte, de forma bem objetiva

A pensão por morte é um benefício previdenciário pago aos dependentes de quem falece, desde que a pessoa que morreu fosse segurada da Previdência Social ou de um regime próprio.

Na prática, funciona assim:

  • alguém contribuiu para o sistema previdenciário
  • essa pessoa faleceu
  • os dependentes, como filhos menores, cônjuge ou companheiro, podem ter direito a uma pensão por morte, se cumpridos os requisitos da legislação

A pensão por morte:

  • tem natureza previdenciária
  • depende de contribuição anterior
  • está ligada ao vínculo da pessoa que faleceu com o sistema de previdência

Já o BPC:

  • é assistencial, não exige contribuição
  • é voltado à proteção mínima de quem não consegue prover o próprio sustento nem ser sustentado pela família

Essa diferença de natureza é justamente um dos motivos pelos quais a lei proíbe que a mesma pessoa some BPC e pensão por morte ao mesmo tempo.

BPC e pensão por morte, por que não podem ser recebidos juntos pelo mesmo beneficiário

A lógica da não acumulação é a seguinte:

  • o BPC existe para proteger quem está sem proteção previdenciária suficiente
  • se a pessoa já recebe uma pensão por morte ou outro benefício previdenciário, o sistema entende que ela já está, de alguma forma, amparada

Por isso, a legislação assistencial proíbe expressamente que o titular do BPC acumule esse benefício com outro benefício da seguridade social ou de outro regime, como aposentadoria, pensão por morte ou auxílio por incapacidade, salvo algumas situações excepcionais e específicas.

Na prática, isso significa:

  • se a criança autista já recebe pensão por morte, ela não pode, ao mesmo tempo, receber BPC no mesmo CPF
  • se o adulto com deficiência recebe aposentadoria ou pensão por morte, não pode acumular BPC sobre a mesma titularidade

Quando, por algum motivo, dois benefícios incompatíveis chegam a ser concedidos, a regra é de escolha pelo benefício mais vantajoso, e em muitas situações os valores recebidos podem ser compensados mês a mês, principalmente quando há decisão judicial.

A diferença entre mesma pessoa e mesma família

Aqui está um ponto que gera muita confusão e preocupação nas famílias: uma coisa é falar da mesma pessoa, outra é falar da mesma família.

A vedação de acumular BPC com pensão por morte vale para o mesmo titular, a mesma pessoa, o mesmo CPF. Isso não significa que em uma família só possa existir um benefício.Alguns exemplos ajudam:

  • uma criança autista pode receber BPC e a mãe pode receber pensão por morte dela mesma, se tiver direito, sem nenhum problema
  • é possível que duas pessoas da mesma família recebam BPC, se cada uma preencher individualmente os requisitos
  • o que não pode é a mesma criança autista receber, ao mesmo tempo, pensão por morte e BPC em nome dela

No caso que motivou este artigo:

  • a criança autista já é titular de uma pensão por morte
  • por causa da regra de não acumulação, ela não pode ser titular de BPC ao mesmo tempo
  • isso não impede, por exemplo, que se analise a situação da mãe, que tem transtorno mental ou outra condição que possa caracterizar deficiência, para verificar se ela, como pessoa, preenche os requisitos para o BPC em nome próprio

Ou seja, a pergunta correta não é apenas “a família já recebe pensão por morte?”, mas “quem recebe? quem é o titular?”.

E se a pensão for muito baixa, seria melhor o BPC?

Em muitos casos, a pensão por morte recebida pela criança ou pela pessoa com deficiência é de valor muito baixo. Nesse contexto, a família começa a se perguntar:

será que não seria melhor o BPC, já que ele sempre corresponde a um salário mínimo?

Aqui é importante separar duas ideias:

  • não é possível acumular BPC e pensão por morte para a mesma pessoa
  • em algumas situações, é possível optar pelo benefício mais vantajoso, desde que todos os requisitos estejam preenchidos

Por outro lado, essa troca exige cautela:

  • a pensão por morte é benefício previdenciário, pode ter cálculo próprio e, em alguns cenários, pode ser melhor ao longo do tempo
  • o BPC não tem décimo terceiro, não gera pensão por morte para dependentes e pode ser revisto com mais frequência, especialmente na análise de renda familiar

Por isso, antes de qualquer pedido de renúncia, de troca ou de discussão judicial, o ideal é:

  • comparar valores de forma realista
  • analisar a estabilidade de cada benefício
  • avaliar os impactos a curto, médio e longo prazo na vida daquela criança ou daquela pessoa com deficiência

Na prática, em grande parte dos casos que envolvem crianças autistas com pensão por morte, a solução mais segura costuma ser:

  • manter a pensão por morte para a criança
  • avaliar a possibilidade de BPC para outro membro da família que efetivamente preencha os requisitos, como a mãe com deficiência ou transtorno mental grave

Dicas práticas para famílias de crianças autistas e pessoas com deficiência

Alguns cuidados ajudam bastante na hora de pensar em BPC e pensão por morte:

  • verifique sempre em qual CPF o benefício está sendo pago
  • antes de entrar com pedido de BPC, veja se aquela pessoa já recebe algum benefício previdenciário
  • não confunda “não pode acumular no mesmo CPF” com “ninguém da família pode ter outro benefício”
  • organize documentos médicos e exames que comprovem deficiência de outros membros da família, caso se cogite BPC para mais de uma pessoa
  • não tome decisões de renúncia ou troca de benefício apenas com base no valor imediato, sem olhar o futuro

Uma pergunta que vale ouro é:

qual combinação de benefícios protege melhor essa família hoje e daqui a alguns anos?

A resposta nem sempre é óbvia e, por isso, a análise técnica faz tanta diferença.

Conclusão

A regra de não acumulação entre BPC e pensão por morte não existe para punir famílias, mas para delimitar o papel de cada tipo de benefício: o previdenciário, como a pensão, vinculado à contribuição; e o assistencial, como o BPC, voltado a quem não tem proteção previdenciária suficiente.

Para famílias atípicas, com crianças autistas ou pessoas com deficiência, isso tudo aparece em situações muito concretas: falta de renda, contas que não fecham, terapias essenciais, laudos, remédios, deslocamentos. Por isso, conhecer essa regra e entender como ela se aplica na prática é fundamental para tomar decisões mais seguras.

Se você tem um filho autista ou outro familiar com deficiência e está perdida entre BPC, pensão por morte, benefício previdenciário e renda da família, você não precisa resolver isso sozinha.

Podemos analisar juntos:

  • quais benefícios já existem hoje
  • se algum deles impede a concessão de outro
  • se há espaço para um pedido de BPC em nome de outra pessoa da família
  • qual é o cenário mais protetivo para o futuro dessa criança ou dessa pessoa com deficiência

Envie uma mensagem no WhatsApp para agendar uma consulta previdenciária voltada para pessoas com deficiência e famílias atípicas.

Atendimento em Itajaí SC e em todo o Brasil, especialista em Direito Previdenciário, da Saúde e Direitos dos Autistas.

Mãe atípica na defesa dos autistas. 💙

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